Chuva ou sol, era fácil encontrá-lo na rua. Sempre com um gorro na cabeça e um cigarro no canto da boca, talvez passasse despercebido aos olhos de quem passa, como tantos outros que, perambulando sem rumo certo, são vistos, mas não percebidos.
Acontece que havia um violão. Não que fosse um músico excepcional, muito longe disso, mas era nele que buscava seu significado, era por meio dele que se expressava e se relacionava com os outros, talvez até melhor que com as palavras, embora fosse sempre amável com as pessoas.
Frequentava o centrinho de Capivari, onde se oferecia para tocar para para quem passasse, pedia qualquer coisa, dois, cinco reais, e começava a desfiar riffs famosos de bandas de rock. Aliás, tinha um belo repertório, Metallica, Iron Maiden, Deep Purple, estavam todos lá, aprendidos ao custo de muita insistência e, também da colaboração de quem tivesse paciência para ensinar alguma coisa. Eu mesmo já afinei aquele violão algumas vezes, guitarristas davam cordas quando as dele quebravam e, sabendo disso ele procurava sempre estar perto de quem tocava.
Fato é, que passou a fazer parte, à sua maneira, do meio da cena musical da cidade e do imaginário das pessoas. Poderia ter sido um mendigo ou um andarilho, mas era o Catita. Tinha até uma comunidade do extinto Orkut com seu nome, Catita Pop Star. Não pense que isso é pouco, tenho certeza que, fosse eu a partir hoje, não seriam muitos os que se lembrariam de mim como o Renato, que tocava baixo em tal banda, com tais músicos. Não haveriam tantas histórias a contar.
E, ainda assim, muito pouco se sabia sobre ele. O que se conta é que perdera sua família num deslizamento de terra e que ele ficara sozinho no mundo. Certo é que passou por muitas dificuldades.
Uma pena, realmente. Uma pena que tenha sofrido tanto, não só pelos problemas mentais que tinha, mas também pelas mãos de pessoas que tiravam proveito de sua ingenuidade e o maltratavam sem motivo. Uma pena que tratem ainda tão mal essas pessoas, que são tão frágeis, tem tão pouco, mas que marcam as vidas das comunidades de que fazem parte. E eles estão sempre por aí, toda cidade tem seus “doidinhos”.
Ontem ele faleceu, fiquei sabendo hoje. Foi-se o homem que viveu como criança, tocou de alguma maneira a vida de todos nós. Morreu o menino, mas fica a personagem, que sempre andará pelas avenidas, cigarro no canto da boca, violão no peito e pedindo: “Irmão, me ensina uma música aí!”
Esteja em paz!